Artigo de opinião

Avaliação da performance acadêmica: além do CR


1 6min

Escrito por Beatriz Souza em 26/07/23.

Avaliação da performance acadêmica: além do CR

Atualizado em: 27/07/23

O universitário que nunca se preocupou com o coeficiente de rendimento (CR) do período, se iria cair ou não, que atire a primeira pedra.

    O coeficiente de rendimento (CR) é um número utilizado para avaliação da performance acadêmica, sendo ainda colocado como um aspecto central do sistema educacional superior, pois serve como indicador do desempenho dos estudantes ao longo de sua jornada. Apesar do CR refletir as notas obtidas pelos alunos em disciplinas e atividades acadêmicas, não é incomum se deparar com debates acalorados sobre ele na Universidade.

    Algumas pessoas acreditam que o CR é uma métrica confiável para avaliar desempenho, outros argumentam que essa medida não é suficiente. Este número, contudo, pode ser influenciado por diversos fatores - o rigor dos cursos, a política de avaliação adotada pela instituição e até mesmo a habilidade individual de lidar com diferentes métodos de ensino e aprendizagem. Parece importante questionar, então, se o CR é um reflexo preciso do potencial e competência dos estudantes. Não deveria a avaliação acadêmica ir além do CR, considerando outros aspectos como habilidades, experiências, projetos e contribuições relevantes para a área de estudo?

Avaliando por outro ângulo: mesmo que o CR possa de fato refletir o rendimento num determinado curso, sempre haverá uma diferença entre o CR médio deste quando comparado com outras graduações.

    É contraditório utilizar para fins comparativos, o CR como forma de avaliação do desempenho acadêmico entre diferentes áreas do conhecimento, pois enquanto alguns possuem um padrão mais elevado de média, outros podem apresentar uma média mais baixa, pois, para cada Cadeira existirá um grau de dificuldade curricular único e próprio. Observa-se que, ao final da graduação, alunos de cursos com médias mais elevadas podem ser percebidos como tendo um desempenho superior, refletindo em vantagens na hora de concorrer a vagas de estágio e até mesmo de bolsas de pós-graduação. Ou seja, essa heterogeneidade no CR médio também pode influenciar nas oportunidades de trabalho e de continuidade na carreira dos recém-formados. Por outro lado, estudantes de cursos com médias mais baixas podem enfrentar um maior desafio para se destacar no mercado de trabalho e para seguir uma trajetória acadêmica mais competitiva.

 

O Papel do CR na Competitividade Acadêmica

    A forma como avaliamos e nivelamos todos na Universidade, muitas vezes desconsidera aspectos não acadêmicos, porém valiosos para o mercado de trabalho como habilidades interpessoais e competências práticas, que também desempenham um papel fundamental no desenvolvimento de um pesquisador. Na sua essência, a função da Universidade na nossa sociedade é formar pessoas capazes de criarem soluções, portanto colocar como elemento essencial do aprendizado apenas conhecimento teórico, não permite que habilidades de comunicação, pensamento crítico e resolução de problemas sejam valorizados.

    Quando se olha para os critérios universais de seleção, como em bolsas de intercâmbio, por exemplo, a disparidade entre alunos de diferentes cursos se torna ainda mais evidente. Colocar, como único critério de seleção para tais oportunidades, um número cuja média em alguns cursos é 6 e em outros chega a ser 8 propõe uma corrida injusta e exclusiva, pois o coeficiente de rendimento é apenas um dos aspectos que compõem a jornada acadêmica de um estudante. Afinal, quando se trata de oportunidades internacionais, é preciso considerar a diversidade de trajetórias e o potencial dos candidatos para contribuir com uma experiência enriquecedora.

    Infelizmente, este erro de avaliação não se limita apenas às bolsas de intercâmbio. Muitas oportunidades de estágio também requerem um CR mínimo para que os estudantes possam receber bolsa ou até mesmo se candidatem, deixando de lado aqueles que, apesar de terem outras habilidades valiosas, podem ter tido um desempenho acadêmico mais modesto. Além disso, em seleções para monitoria e outras atividades acadêmicas, o CR é frequentemente utilizado como critério classificatório, relegando aqueles com CRs mais baixos a uma posição de desvantagem. 

Fica claro que o saldo desta abordagem é a exclusão de estudantes talentosos e promissores, que possuem potencial para contribuir significativamente para a pesquisa e para a academia, mas que podem não ter alcançado altos CRs devido a uma série de circunstâncias pessoais ou acadêmicas.

    A ênfase excessiva no CR cria uma cultura de competitividade desenfreada, onde os estudantes são incentivados a priorizar a busca de notas elevadas em detrimento do desenvolvimento de soft skills e conhecimentos mais amplos - cada vez mais essenciais no mercado de trabalho.

 

Repensando a avaliação de futuros pesquisadores 

    Parece, então, essencial repensar o papel do CR médio na avaliação dos futuros pesquisadores da Academia. Ou seja, acreditar que um número isolado é capaz de capturar toda a essência do potencial e competência de um estudante é reducionista e limitador. Ao adotarmos uma abordagem mais abrangente, que valorize a diversidade de talentos e habilidades dos estudantes, reconhecemos que cada indivíduo tem seu próprio caminho de aprendizado e desenvolvimento, tornando uma ferramenta que promova a equidade, a inclusão e o reconhecimento da pluralidade de trajetórias e conquistas de cada futuro profissional. 

Para promover uma avaliação mais abrangente e justa dos estudantes, é essencial que as instituições de ensino e as organizações de fomento reavaliem seus critérios de seleção e considerem outros aspectos além do CR.

    A inclusão de entrevistas, avaliações de competências práticas, análise de projetos realizados e recomendações de professores podem ser alternativas para identificar estudantes talentosos e engajados, independentemente do CR. Dessa forma, será possível valorizar e reconhecer as habilidades e contribuições únicas que cada estudante pode trazer para o campo da pesquisa científica.

    O êxito acadêmico e profissional vai além das notas em um boletim - é importante lembrar! O resultado da “equação do sucesso” possui variáveis que não podem ser aprendidas em teoria, como boas relações interpessoais, experiências extracurriculares, habilidade de dialogar com profissionais de áreas distintas, entre outros. Portanto, reavaliar o peso atribuído ao CR médio ao adotar uma avaliação mais abrangente, considera a multidimensionalidade do percurso acadêmico e suas realidades, e valoriza suas conquistas e potenciais. Dessa forma, estimula-se o desenvolvimento integral dos futuros profissionais e promove a excelência acadêmica de maneira mais justa e inclusiva. No fim, a ciência e a pesquisa se beneficiam da diversidade de perspectivas e conhecimentos, e é preciso criar um ambiente acadêmico que promova a inclusão e a igualdade de oportunidades para todos os estudantes.

 

Beatriz Souza

Beatriz Souza


Assistente de produto do Coractium. Bacharel em Biofísica pela UFRJ, com experiência em pesquisa básica sobre o Sistema endocanabinoide no Sistema nervoso Central, bem como experiência em projetos extracurriculares e voluntariado em ensino.


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